Palavras não fazem muita diferença, ações sim
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤDeviam ser por volta de quinze para uma da tarde quando ocorreu. Eu havia passado na escola onde eu concluí o ensino fundamental para dar notícias aos meus antigos professores, aqueles que me viram crescer. Já elaborava escrever algo sobre como o tempo passa e como eu sinto falta daquele tempo em que minha maior preocupação eram os testes e provas de matemática. Mas algo mudou isso.
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤA chuva começou a cair antes mesmo que eu pudesse chegar ao ponto de ônibus. Sob o guarda-chuva eu esperava com pressa a condução, tudo normal naquela cena: a chuva insistente, pessoas com seus guarda-chuvas, carros e um vira-lata se arrastanto pela rua. Normal?
Infelizmente sim.
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤO cão de pêlo amarelo sujo se arrastava por uma curva intensa movimentação passando por poças apenas com as patas dianteiras, parando quando corria risco de vida. Era brilhante o modo como ele percebia que se avançasse no momento errado sua vida estaria acabada. Fiquei pensando se sua paralizia tinha se dado devido algum atropelamento ou simplesmente por uma anomalia mitocondrial no DNA.
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤO pior de tudo foi assistir aquela luta quase humana com único pensamento: — Vá, ajude-o como você faria por um ser humano! Vá, ajude-o logo, não importe-se de se molhar e ter a mão suja, basta contar a verdade quando chegar no trabalho. Mas não, eu não fui. A batalha travada dentro de mim já estava ganha e eu não iria.
Sentia o grande impulso de chorar, de gritar: — Alguém o ajude, por favor ! Porque é tão fácil ajudar um cadeirante ou um cego e tão difícil mover-se para socorrer um ser que não chega a ter a metade da sua altura?
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤMas essas perguntas não eram para nenhuma daquelas pessoas, eram para mim. Porque foi tão difícil cogitar a ideia de que eu poderia deixar o guarda-chuva protegendo a mochila e ir ajudar o cão? O cachorro quase me fez chorar. Só não chorei por vergonha. Não de demostrar que choraria tanto quanto chovia, mas por vergonha de mim mesmo. Vergonha por ser tão mesquinho quanto qualquer pessoa ali que assistia.
Queria voltar para casa e dormir, e só acordar quando aquela cena desaparecesse da minha mente. ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤFiquei imaginando — nada de agir — se aquelas outras pessoas também lutavam internamente, se estariam envergonhadas delas mesmas, se queriam chorar por se sentirem propositalmente incapazes. Porém, imaginava também se aquele cão não pensava em apenas ficar parado ali, esperando uma batida para acabar com todo aquele sofrimento e humilhação. Foi pior pensar isso e perceber o quão fútil foi aquele tipo de pensamento. Você não vê deficientes (não importo de falar portadores de necessidades especiais, não irá me tornar preconceituoso por isso) parados no meio da rua esperando um carro os atropelar, vê? E porque esperava isso daquele cachorro?
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤEsses pensamentos foram banidos quando uma senhora — abençoada seja — que levava o filho a escola se aproximou e com alguns gestos, assustando o cachorro, o fez ir para a calçada. Me vi forçando passos até a mulher que me olhou assustada quando parei ao seu lado e disse: — Obrigado.
Duas coisas: Sim, foi um texto real. Aconteceu. E a foto eu achei na web, que por incrível que pareça me transmitiu todo o sentimento de incapacidade que tive mais cedo. Sem mais. Boa noite.
2 comentários:
Nossa , quase me fez chorar também ! Obrigado moça ! +1
@Meninas: Luiza Xavier
QUASE CHOREI AQUI ç_____ç
QUERO DAR UM BEIJO NA MULHER QUE TIROU O CACHORRINHO DE LÁ <3333
Você escreve muito bem *-*
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