sábado, 16 de fevereiro de 2013

Malafaia, o Papa e intolerância.


Aproveitei que meu sábado foi tedioso para poder escrever. Acabou que não sai para lugar nenhum por conta de uma preguiça desumana (sem contar o fato de eu estar saindo desde o Carnaval) e me contentei (ou nem tanto, estou mentindo) por ficar em casa de pijamas, bebendo cerveja e escrevendo esse texto que eu já estava planejando há umas semanas. Inclusive ele é uma dívida a todas as pessoas que vieram me perguntar se eu não escreveria sobre o caso Silas Malafaia (a polêmica entrevista do pastor com Marília Gabriela).

Ironicamente, os três assuntos abordados têm seus meios em comum. Vá entender. Mas é como um ciclo, e infelizmente, de coisas ruins. E parece que coisa ruim é sinônimo de Silas Malafaia. Que apesar de ser um homem inteligente me dá náuseas toda vez que abre a boca. Não vou dar uma de ativista aqui agora para ganhar curtidas, mas discordo em gênero, número e grau com tudo o que ele fala. O "x" da questão e o que me preocupa bastante é ver que Malafaia é um homem influente e que tem o dom da oratória. E claro, sem contar que está a frente de uma congregação muito forte dentro da sociedade atualmente. Em plena rede nacional, ousou dizer que 46% dos homossexuais foram violentados durante a infância e 54% escolheram ser. E sem fornecer fonte alguma sobre esse e outros dados. Além de falar que a Teoria da Evolução não é comprovada cientificamente. E teve o ápice não só da minha vontade de vomitar, mas acho que da maioria, quando disse: "Eu não acredito que dois homens possam criar uma criança perfeita e que dois homens e duas mulheres tenham capacidade para desenvolver um ser humano."

A entrevista gerou tanta polêmica desde o dia em que foi ao ar (03/02) que foi parar nos assuntos mais comentados da internet, resultando também em dezenas de vídeos contestando os argumentos falhos do pastor (inclusive o depoimento de um geneticista e biólogo) e numa petição para caçar seu registro de psicólogo. É óbvio que uma entrevista dessas não aconteceu inocentemente, uma vez que Silas é conhecido por suas declarações polêmicas acerca do aborto e da homossexualidade. Quem saiu ganhando em audiência foi o SBT e todos os fundamentalistas que seguem a doutrina de ódio que esse pastor prega. Eu poderia escrever uma tese sobre essa entrevista e o comportamento do Mala, mas os outros assuntos precisam ser levados a público com tanto fôlego quanto esse ódio que o pastor apresenta aos seus fiéis.

Não muito distante de um pastor, está um cardeal com seus princípios dignos de entrevista com Marília Gabriela. Ou nem tanto, eu gosto da Gabi. Mas imagine a história: o Papa renuncia o cargo de maior líder espiritual do mundo. Coisa que aconteceu pela última vez em 1415. Logo depois, algumas pesquisas indicam que um dos possíveis sucessores é um homem negro, natural de Uganda mas que é a favor da pena de morte à homossexuais. Não, isso não é o próximo livro do Dan Brown (pelo menos não agora), mas aconteceu no início da semana para o choque do mundo inteiro. E o possível sucessor de Bento 16 se chama Gana Peter Turkson, um homem negro que talvez tenha esquecido que homossexuais são tão perseguidos quanto os negros. Em época remotas, inclusive pela própria igreja, que também usava a bíblia como argumento.

Onde esses dois horrorosos casos refletem? No nosso cotidiano. Talvez não diretamente a ponto de toda a sociedade enxergar a culpa neles, mas de uma forma sútil que nos assalta sempre que abrimos um jornal e lemos sobre agressões a homossexuais. Ou quando vemos alguém na rua gritar insultos à um casal, à um travesti ou à um pai e um filho abraçados como já aconteceu num passado que foi obrigatoriamente esquecido. E eu registro o meu medo aqui. Não por esses líderes religiosos, mas pelo peso que os nomes de Silas Malafaia e do Papa têm sobre as sociedades do mundo todo. O poder da oratória que lhes foi dado é pior que qualquer arma, pois incita reações de desaprovação e ódio em quem os segue, alegando estar fazendo a vontade de Deus. Estou imparcial a todas as religiões, mas é lastimoso ver que uma mensagem de paz tem sido tão distorcida a ponto de encararem como a única verdade absoluta.

O ser humano tem muito medo daquilo que não entende, isso sempre ficou claro na nossa história de vida como sociedade. Tendo como um dos maiores exemplos de intolerância, a homossexualidade não é o único agravante que comprova esse medo que o homem tem do desconhecido. Lucas Viglio (heterossexual) é uma das vítimas desse reflexo de ditadura que temos aceitado conviver a cada dia. Em uma viagem de ônibus na última terça de Carnaval foi tratado de forma repulsiva e preconceituosa pelo motorista da empresa, apenas por exibir suas duas tatuagens na perna. A agressão do motorista para com o estudante se deu com um simples, porém insultuoso, assobio diferenciado que segundo o mesmo era coisa de bandido. Com esse tipo de comportamento é notável que não só a parcela gay está sofrendo com a intolerância.

O que está acontecendo com a população? Será que é tão difícil assim aceitar a realidade dos outros? Quem dita o que é normal ou certo? O Deus que é citado ou a igreja que cita o deus? Todos têm a falsa imagem de que carregam o martelo do juiz apenas porque sua doutrina prega a única verdade redentora. Não tem Malafaia, Papa negro ou motorista de ônibus certo... Nós somos livres, merecedores do direito de ir e vir para onde, com quem e do jeito que quisermos. O que esses episódios nos mostra é que nós não estamos munidos o suficiente para combater o medo e Jean-Paul Sartre, filósofo francês do século 20, de todo modo estava certo ao escrever que o inferno são os outros.

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